domingo, 17 de janeiro de 2010

O VÉU DA ILUSÃO



O Véu da Ilusão

Todo relacionamento que estabelecemos uns com os outros na Terra
é, em última instância, uma relação com nosso Criador, que está acima
de todas as coisas.

A Última Instância é o que está por trás e acima de todas as coisas. É
a Instância da Verdade.

Mas, em primeira instância, quando vemos o outro diante de
nós, ainda não veremos Deus nele, refletindo a Sua luz, pois, naquele
instante perdido, ainda esquecidos, não sentimos nem sabemos que
Deus está em nós e nós Nele, eternamente

Em Primeira Instância, nós nos relacionamos com uma máscara de
Deus, ou melhor, com uma máscara que oculta Deus, uma coisa entre
coisas, a que chamamos: ELE, ELA, VOCÊ, VOCÊS ou NÓS, ISTO E
AQUILO. O fazemos identificados com outra máscara, feita
especialmente na medida do nosso passado, outra coisa entre coisas,
feita de corpo e vida breve, algo a que damos tanta importância ao
ponto de chamá-la de EU, a pedra angular da ilusão.

Assim, querendo parecer algo diferente para outros, que também
querem parecer algo diferente para nós, todos seremos muito iguais no
parecer, sendo todos bem diferentes da Verdade.

Nós, os mascarados, sentimo-nos sós e vazios de significado,
num mundo que é visto como um palco, onde os personagens se parecem
a uma legião de estranhos separados, mas cujos atores permanecem
desconhecidos, até para si mesmos. Grande é a confraria dos
esquecidos.

Mas, neste labirinto de máscaras, alguns tolos imaginam que Deus
não nos ama, imaginando também que fomos criados como corpos
mascarados, pré esquecidos da “Imagem e Semelhança” e de Onde
viemos. Ao imaginar que fomos condenados à separação e a viver os
dramas neste imenso palco - sem poder sair de cena desde nascidos -
vamos em busca de algo que se pareça com união, que se pareça
com amor, sem saber que no palco, nada é o que parece ser. Cenas
de desilusão são permitidas e são sempre reencenadas. O amor no
palco e todo amor representado ali é, no entanto, convincente, pois é
devidamente mascarado pela pretensão de ser real, a patologia dos
mascarados.

Algum de nós escolhemos acreditar que isto tudo aconteceu por
nossa própria causa, em algum instante antes do Big Bang original.

Culpados, escondemos pecados por trás de nossas máscaras e não
poderemos mais tirá-las, sem o risco da exposição. Sem a máscara, sem
o parecer que atesta nossa pretendida inocência, o que verão em nós
é o culpado pelo pecado original, que retorna da tournée da origem
para vir representar no palco, o mais ordinário dos transgressores,
exibindo seu banal pecado mortal, seguido de vergonha e culpa. Mas
quem sabe ele escapará habilmente, com a ajuda de um infeliz bode
expiratório sendo colocado no lugar do verdadeiro réu?

Neste drama encenado nas sombras da culpa, o outro refletirá para
nós, não mais a máscara da falsa inocência, mas a face desnuda de
nossos pecados. Assim, passaremos a vê-lo sem piedade e o julgaremos
pela medida da nossa culpa, delegando a ele, por baixo da mesa de
um júri sonambúlico, apenas uma das nossas faces, a mais tenebrosa e
congelada, a face do pecado original, a ser representada e animada
em fisionomias repulsivas, projetadas na tela do tempo, para o
alívio dos que assistem e se dizem: ainda bem que ele não sou eu. Mas como
poderia deixar de sê-lo, pois se, na Realidade, o outro é eu?

O pecado, mercadoria de valor na Primeira Instância nunca chegará
a ter crédito no Tribunal da Última Instância, pois ele é a
queda da Última Instância.

O Excelentíssimo Juiz desta Instância Superior só vê o que é santo em
Sua Criação. Sua justiça é cega para a ilusão e não vê nada que diga
respeito ao tempo ou ao espaço. Impassível, Ele não crê no que
parece acontecer na tela coletiva desta grande ilusão feita por
seu único filho em sonhos.

Embora só exista na Realidade Um-Agora-Perfeito-e-Eterno, o
pecado é a ilusão que caiu da realidade como um fruto malsão,
projetando-se no tempo e inaugurando aí seu tribunal de Primeira
Instância. Mirem lá os seus fantasmas, juízes obscuros, partidários
e reféns corruptos da idéia da separação. Nesta instância há uma lei que
nega toda e qualquer possibilidade de inocência. Nesta total ausência
de Deus, impera também a impossibilidade do Seu perdão, e nem
sequer um golpe de misericórdia é concedido aos que não merecem
vida, mas somente a pior das mortes.

Será preciso ir mais longe ainda para desmascarar algo mais
profundo que a Sombra do Pecado, algo que jaz para além da face
da culpa. Será necessário mergulhar nas masmorras do inferno, para
ver lá outra face, cheia de lágrimas de sangue, naqueles que se
sentem condenados pelo pecado da separação de Deus: Aí todos
moram dentro de um grande coração ferido por uma coroa de
espinhos e aí permanecemos todos, as mesmas criançinhas feridas que
um dia já fomos.

É por isso que Jesus disse: “Vinde a mim as criancinhas, porque delas
é o reino de Deus”.

Mas mesmo chegando até aí, porém ainda iludidos, não poderemos
sentir o alívio das mãos de Deus - o Seu Amor - pois a face da
dor apenas revela outro aspecto inconsciente da nossa relação com o
falso Deus inventado - Aquele que nos julga e condena por trás
de toda a cena - pois aí ostentamos nossas feridas e as mostramos a Ele,
porém ocultando-as do mundo, por nossa vergonha. Aqui escolhemos
alimentar os velhos sofrimentos para barganhar com o falso Deus, pois
que já nos sentimos punidos, pelo simples fato de termos nascido e
sofrido o bastante aqui, no mundo dos separados, dos Judas de si
mesmos.

Aqui, somos os guardiões inconscientes da nossa culpa e dor,
os carcereiros dos nossa condição inexorável, e pior, somos os carrascos e escutores do próprio castigo imaginado como merecido. Não é consciente o que fazemos no fundo deste abismo sombrio, mas se o fazemos, (julgando que foram outros que nos fizeram) é na esperança de que assim não será mais necessário que o Deus Terrível da Justiça, venha no final dos tempos, sentar no Seu trono para nos julgar e punir, na hora da nossa morte, Amém.
E o Deus do Amor, que nunca habitou tais pesadelos, ficará ainda oculto pela escuridão lamentosa dos nossos desterros auto infringidos.
Ele será mantido oculto pela nossa Máscara da Inocência, obscurecido
pela Sombra na face da culpa, e visto como insensível à nossa dor não
curada. Grande é dor da nossa Criança Ferida, em sua viciada busca
desesperada por repetir suas cenas passadas de magoa, abandono e
abusos.

Assim, neste palco tragicômico, enxergamos a nós mesmos nos outros
refletidos, ora vemos um ora um outro, um dos três personagens
absurdos, os escravos do pecado: Vemos os outros pelos olhos das
nossas máscaras, pelos olhos das nossa sombra ou entre as lágrimas da
nossa dor e interpretamos tão convincentemente nossos papeis ao
ponto de identificar-nos totalmente com eles. Mas também,
interpretamos um significado marcado ao papel que delegamos aos
outros, de acordo com o velho enredo de nossas histórias infantis. E se
insistimos corrigir no presente aquilo que foi uma dor passada, apenas
repetiremos a mesma dor.

Podemos então nos vingar do que ocorreu, pois é este o papel do
tempo, o grande anfitrião indulgente com relação à visita da dor. O
tempo - mecenas das ilusões. Em seu bojo a vingança vem querendo
resolver a trama, vem se vingar e vencer ou decidir-se pela
própria morte, deixando outros como culpados.

É o mesmo e velho tempo, onde o destino será deixado sem
resolução, engolido pela força da injustiça do mundo, apesar da
indignação, apesar do espanto.

Mas a lei que rege o palco do tempo é inexorável: Tudo o quando
acreditamos e, principalmente, o que atuamos, terá suas
conseqüências no tempo. Se sofrermos, será somente a colheita do
merecido. Se é merecimento meu, assim também é o do outro, pois
vemos nos outros o mesmo sofrimento merecido e, solidariamente,
ajudaremos uns aos outros a aumentá-lo em nossas relações insanas,
insistentemente reencenadas.

E há um porquê para toda esta insanidade?
Já que o inferno é tão temido - desde o susto que nos fez perder a
eternidade na queda original - já que seu fogo é intuído como sendo
muito pior por ser o próprio desconhecido, nós nos atrelaremos
medrosamente ao conhecido. Por isso, no palco, preferimos o nosso
drama, pois já o sabemos de cor. Reencenado-o, compartilhamos uns
com os outros o inferno do conhecido, do previsível, do controlável, do
menos pior.

Mas esse tão bem conhecido outro que é visto no espelho da ilusão é
apenas o nosso pseudo conhecido outro. Ele ainda oculta de nós o
Verdadeiro Outro, a luz encarnada do Verdadeiro Deus. E o inferno do
conhecido apenas oculta um amor desconhecido que, pela nossa
entrega a ele, nos redimiria da dor.

A ilusão não nos deixa saber que o inferno, com seu tão temido
e Desconhecido fogo é, na verdade, o abrasante Amor de Deus por nós,
que desfaz as sombras, dissolve a culpa, ri na face hedionda do medo,
cura a dor e revela na transparência a pureza do imortal do Filho de
Deus em nós, revelando Sua Imagem, Sua Semelhança.
Por isso, amar a Deus sobre todas as coisas é a nossa única
necessidade, pois Nele todas faltas cessam. Assim também, o
abrasante amor de Deus por nós e o nosso intenso amor por Ele, é o
único e último medo, por trás de todos os medos, pois nele a ilusão fica
trêmula ao encarar a sua dissolução inexorável no fogo do amor.

Mas o Deus do Amor, o Verdadeiro, sabe compassivo que Ele é
confundido por nossas ilusões. Ele sempre nos espera, como uma Mãe
que se faz criança e permanece escondida para brincar com seu filho,
até que ele a encontre. Esta Mãe, já é feliz porque será descoberta por
trás dos véus. Ela estava quieta e amorosa e desde sempre lá, onde o
tempo desemboca no mar da eternidade.

Ela então convida seu filho inocente para o jogo mais pleno
de todos no Seu Reino sem limites.

E, para alegria do amor de ambos brincando eternamente de serem
só um no mesmo amor, o Seu filho, agora sem máscaras nem ilusões,
lhe diz galante em sua roupa de Glória:

- Sim Mãe, eras Tu por trás de tudo e em tudo. Finalmente despertei,
eu te achei! A Ti me entrego, pois sempre fui e serei Teu.

Sergio Condé
Estudo de UCEM (Um Curso em Milagres)

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